Em novembro, a comunidade do Jardim Botânico recebeu a triste: notícia que o Tabladinho fechou, para 2024, suas atividades como escola de educação infantil, permanecendo apenas com seus cursos livres. Isso mexeu comigo e ainda estou administrando a perda. Minha filha, Carolina não estudou lá, mas fez alguns cursos livres e, de alguma forma, sempre fizemos parte da comunidade Tabladinho.
A conexão começou em 2004, quando a escola, através das queridas Lúcia e Inez, foi a primeira parceira do projeto Amigos na Praça. Por muitas edições, professores e alunos estiveram presentes nos eventos de troca de livros na Praça Pio XI. Foi através delas que conheci outro grande parceiro, a turma do Moleque Mateiro.
O Tabladinho tem um valor inestimável para o bairro. Criado, na década de 1960, por Vera Motta, Aracy Mourthé e Vera Fernandes, o espaço era chamado de Clube, e funcionava como um curso livre no final da tarde, atendendo a crianças de 6 a 12 anos. Aos poucos elas foram criando turmas de e nos anos 1990 se estabeleceram com uma instituição voltada para a educação infantil. Ali estudaram pequenos seres que hoje estão por aí, fazendo diferença no mercado de trabalho. Sem falar dos eventos memoráveis da escola, como a festa junina, uma das mais divertidas da região.
As irmãs Motta guardam histórias de um Jardim Botânico de antigamente e consultei algumas vezes elas quando queria saber algo antigo do bairro. Lembro de ter ficado fascinada quando me contaram sobre a Missa do Galo, que acontecia à meia-noite, na noite de 24 de dezembro e reunia várias famílias na igreja Santo Antônio, do Patronato da Gávea. Este ano, ela será realizada mais cedo, às 19h.
Inez e Lúcia herdaram o legado de Vera Motta (foto: acervo pessoal)
O Tabladinho, assim como outros estabelecimentos (ou seus donos) deveriam ser tombados como patrimônio imaterial da região. Tem valores que não se medem pelo vil metal, vão mais além. Tomei ciência disso quando fizemos a série JB em Folhas & Histórias e conhecemos muitos moradores e comerciantes que guardavam pérolas do bairro em forma de história. E este tesouro está espalhado por aqui, é só parar em qualquer balcão e trocar uma prosa. Um exemplo aconteceu, há pouco tempo, com o Seu Morgado, do Jardim Botânico Bazar e Construção. Eu estava precisando saber qual o comércio que tinha ocupado o espaço da antiga academia Pure e, em uma conversa, ele numerou, em ordem cronológica todos os negócios do terreno citado. E mais: ele e seu filho Ricardo ainda contaram outras passagens curiosas que viveram aqui.
Ouvindo boas histórias do Ricardo e do Seu Morgado
E como o Seu Morgado, tem o Seu Toninho, da Lavanderia Santa Helena, com 50 anos de bairro, e o Seu Joaquim, da Speed Bike. Ainda podemos incluir nesta lista o advogado Gustavo Martins, um curioso pela história local e, consequentemente, pesquisador contumaz, sempre em busca de informação sobre a região que adora compartilhar. A mesma coisa acontece no Mercado Afonso Celso, que acaba de completar 60 anos de atividades. Lembro bem de quando me mudei para cá, do mercadinho menor, dividindo o espaço com uma tinturaria; dos meninos Bráulio e Bruno, mais novos, já trabalhando ali e que hoje estão à frente do negócio. Esses profissionais, ao longo dos anos, se tornaram moradores por instinto, por amor ao local onde trabalham e continuam cuidando do seu entorno. É o sentimento de Elton Ribeiro, um dos sócios do bar Jóia Carioca, há 15 anos. Sempre sorridente, está pronto para ajudar no que for preciso e conhece boa parte dos moradores pelo nome. Isso não tem preço.
Elton com a placa que o Bar Jóia recebeu da AMAJB
Recentemente, a AMAJB decidiu premiar, por conta própria, alguns estabelecimentos com placas em homenagem à dedicação e serviços prestados à região. Segundo o presidente da AMAJB, Heitor Wegmann, os critérios para escolha foram antiguidade e ter participado de ações/projetos da AMAJB. Entre os agraciados estão o Bar Jóia, o Mercado Afonso Celso, a Speed Bike, o Tablado e o JB Bazar e construção. A iniciativa é boa, mas precisa ser amplificada e periga ser injusta, se pensarmos em tanta gente que presta serviços honrosos para a região e guarda no bolso bons causos.
Só para lembrar alguns comerciantes e moradores, já entrevistados pelo JB em Folhas: os queridos meninos do trailer do Horto, Júlio e Pedro, que estão à frente da TV Horto e são moradores da região desde criança; Berenice, proprietária da única casa da rua Nina Rodrigues que o pai construiu nos anos 1940; Thereza Mascote, sócia do The Jazz (antiga Carlota Portella), moradora e comerciante há 40 anos, que tem um trabalho incrível de adoção de talentosos dançarinos; a Nélia Vasconcelos, incansável na busca de doações para moradores carentes do Horto; Xico Chaves, artista plástico que também guarda histórias memoráveis com seus companheiros Cafi e Jards Macalé. E por último, mas não menos importante, o Presidente do nosso Suvaco do Cristo, João Avelleira, médico e dublê de jornalista, que tem sempre um dado precioso para acrescentar a cada conversa. E se o assunto é história, não podemos esquecer da moradora Luciene Carris, autora do interessante livro “Histórias do Jardim Botânico: um recanto proletário na zona sul carioca”, que merece ser lido por todos que residem aqui, pois informações valiosas sobre a formação do bairro do Horto.
Enfim, a lista é grande. O importante é preservar essas memórias. E a história do Jardim Botânico e arredores. Quem quiser saber um pouco mais, sugiro visitar nosso canal no YouTube. E aguardem, porque em 2024, o JB em Folhas & Histórias vai voltar.
Eu amo o Folhas & Histórias! Que venha muito mais em 2024!
Chris, acho que a justificativa da escolha dos agraciados com a placa da AMAJB está bem clara: antiguidade e parceria. Não cabe, a meu juízo, a observação adjacente de que “periga ser injusta”. Ninguém desconhece a importância dos comerciantes e prestadores de serviços históricos no bairro. Mas, nesse caso, seria necessário criar outra homenagem com critério diverso.
Ah! Você esqueceu do emblemático FILET DE OURO.