O sucesso estrondoso (e merecido) de “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, está levando brasileiros a torcer pelo Oscar como se fosse a final de uma Copa do Mundo. Os holofotes estão voltados para Fernanda Torres, que já conquistou um Globo de Ouro por sua interpretação magistral de Eunice Paiva, a protagonista do filme, mas outra personagem que também se destaca: Vera Paiva, a Veroca, filha mais velha do casal, interpretada magistralmente pela jovem Valentina Herszage, que, sem chamar a atenção, leva uma vida de pacata cidadã pelas cercanias do Jardim Botânico onde mora.
Valentina e Fernanda Torres no set de “Ainda Estou Aqui” (Foto/acervo pessoal)
Carioca da Zona Sul, com 26 anos, Valentina, apesar da pouca idade, já carrega um currículo invejável, com trabalhos no teatro, na TV e no cinema, com prêmios desde seu primeiro longa “Mate-me por favor”, de Anita Rocha da Silveira, encenado aos 15 anos de idade. Sua formação artística começou no Humaitá, ela cresceu na região, estudando no colégio Sá Pereira, conhecido pelo incentivo às artes, e na Catsapá, onde aprendeu sapateado. Independente desde nova, decidiu morar sozinha em Curicica, aos 19 anos, para ficar mais perto do Projac, onde gravou sua primeira novela, “Pega Pega” e depois seguiu para São Paulo para dar vida à Hebe Camargo jovem, na série homônima.
Como boa filha que a casa torna, Valentina voltou para o Rio e para o Jardim Botânico, bairro com o qual se identifica muito. A atriz valoriza a atmosfera bucólica e está curtindo a casa nova e todo o comércio do seu quarteirão, onde costuma circular, especialmente para degustar um bom café da manhã, muitas vezes na companhia do namorado Gabriel Capobianco.
– Acho que o Jardim Botânico é um bairro muito bom para caminhar e adoro essa possibilidade de ir à academia, buscar meu pão na padaria e passar na livraria. Tudo isso à pé. E ainda estou a 20 minutinhos da casa da minha mãe, no Humaitá – confessa Valentina.
O quarteirão da rua Maria Angélica é especial para a atriz. Ali passa boa parte do tempo na Janela Livraria, escolhido como seu cantinho preferido. Mas confessa que no dia que fez o teste com Walter Salles acabou parando no Enredo Café. “Eu estava com um desejo irreprimível de comer algo “chocolatudo”, para comemorar e devorei uma fatia do bolo de chocolate deles que é muito bom”, revela Val, que também gosta de frequentar a Slow Bakery, o Parque Lage e tem como restaurante preferido o Sud, o Pássaro Verde, da chef Roberta Sudbrack.
A Livraria Janela é quase uma segunda casa para Valentina (Foto: Chris Martins)
Para quem ama caminhar e circular com tranquilidade, o alcance de seu último filme trouxe mudanças no dia-a-dia da atriz. Apesar de ter uma carreira já estabelecida, ela vem se surpreendendo ao ser abordada na rua por pessoas pedindo para tirar fotos ou apenas mostrar apoio e encorajamento na corrida pelo Oscar. Por conta de suas participações em novelas e no cinema alternativo, a atriz acabou conquistando um público eclético, e fica feliz em notar a troca que acontece.
– Muita gente me fala que foi ver o filme porque tinha me visto na novela. E o contrário também acontece. Tem aqueles que me viram no filme e foram atrás de outros trabalhos meus, mais antigos. Acho que consegui levar as pessoas para o cinema, principalmente os jovens que, infelizmente, estão perdendo esse hábito. Isso é muito gratificante. – reflete.
O Mensageiro, outro filme com temática política em que Val atuou. (Foto/Divulgação)
O amor pelo cinema vem desde pequena, graças ao incentivo dos pais, mas não é só a cinefilia que veio do berço. Sua família sempre foi engajada politicamente, chegando a ter membros presos no golpe de 64. E, quase sem querer, ela vem seguindo um caminho de filmes com temática política. Em 2023 teve oportunidade de trabalhar com Lúcia Murat em “O mensageiro” e em março poderá ser vista em “A Batalha da Rua Maria Antônia”, de Vera Egito, que é baseado em fatos reais e retrata um embate que aconteceu na Faculdade de Filosofia da USP, em 1968. Também pode ser vista em “As Polacas”, de João Jardim, onde interpreta uma jovem polonesa que se vê refém de uma rede de prostituição e tráfico de mulheres, enquanto luta para encontrar sua liberdade.
No set de “As Polacas”, praticando seu hobby: fotografia analógica (Foto/acervo pessoal)
Mas, agora é tempo de curtir “Ainda estou aqui” e toda a catarse à sua volta. Ao participar de um filme tão potente, Val reitera a importância de falar sobre a ditadura e julgar os criminosos. Ela acredita que o Brasil tem se encontrado numa situação melhor – em comparação aos anos de governo anterior – mas ainda teme pelas próximas eleições. “A gente nunca sabe o que pode acontecer”, desabafa a atriz, que nunca perdeu uma eleição e faz questão de se manifestar nas mídias.
Apesar de ser da geração das redes sociais, a atriz usa com cautela e tem a noção exata de que é precisa dominar essa linguagem, sem ser dominada, usando os canais com responsabilidade. Valentina Herszage confessa que demorou para reconhecer a importância de estar ativa nas mídias sociais, mas hoje se mostra presente e possui uma bússola moral alinhada. Suas publicações, se não são sobre a carreira, mostram seu interesse pelo mundo da moda e fotografias analógicas.
– Demorei para sacar que eu teria que me envolver mais. Tenho me aproximado mais através da moda, que anda junto com a história do cinema. Ser blogueira não é para mim e eu jamais divulgaria um produto que eu mesma não usasse. Tem que ter responsabilidade e respeito pelas pessoas que você influencia. – explica.
Valentina ainda não sabe se estará no tapete vermelho do Oscar, dia 2 de março. “É uma decisão do distribuidor e são poucos os convites”, pondera a atriz. Mas como sonhar é permitido, ela justifica a torcida imaginando que seria lindo repetir a foto da família na praia, no palco do Dolby Theatre, em Los Angeles, nos EUA e revela que já criou uma hashtag para a campanha: #FilhosNoOscar.
A atriz sonha em repetir a foto da família Paiva do filme no Oscar (Foto/acervo pessoal)
– Eu nem sou religiosa, mas estou rezando para ir. Eu fiquei assistindo as cerimônias anteriores e os vencedores de melhor filme do Oscar desde 2019, para contar quantas pessoas sobem no palco. Outro dia vi que o filme “Parasita” quando ganhou subiu com 23 pessoas no palco. Ajudem a gente subindo a #FilhosNoOscar. Se acontecer, vai ser o máximo! – brinca.
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