Paulinho Moska tem 53 anos de idade, cerca 35 anos de carreira artística e 16 anos de Jardim Botânico. Apesar de sua agenda estar sempre cheia de ideias e projetos, nunca lhe faltou tempo para o que gosta: atuar, cantar, compor, ler, pensar, filosofar, viajar, conhecer, amar, cozinhar, cuidar dos filhos, da casa, das plantas… De repente, tudo parou e ele já não tem mais tempo para fazer tudo o que gosta: “O tempo passa no relógio, mas a gente nunca consegue sair do agora”, reflete o artista.
Nem é preciso ser um grande observador para perceber o quanto o tempo lhe é caro. Basta olhar para suas canções: “O último dia”, “O tempo não passa”, “A idade do céu” (versão de “La edad del cielo”, de Jorge Drexler), “Gotas de tempo puro”, entre outras. Para ele, trata-se de uma questão fundamental para a própria prática artística, que lhe dá a sensação de eternidade, transcendendo projetos e pensamentos criativos.
O tema é mesmo um dos favoritos de Moska e motivou o convite para a edição 2020 do LivMundi, do qual vai participar da sessão Diálogos, ao lado de Cristine Takuá (filósofa, educadora e artesã indígena do povo Maxakali) e Luiz Alerto Oliveira (físico, doutor em Cosmologia e curador do Museu do Amanhã). Os três vão conversar acerca de suas percepções de tempo, no domingo, dia 4 de outubro, às 19h.
– A pandemia dá a clara sensação de que o tempo parou; entretanto, por mais paradoxal que isso pareça, percebo ele passando dentro de casa, com mais tempo para olhar no espelho, para estudar com meu filho, cozinhar, cuidar das minhas plantas – divaga Paulinho, depois de seis meses de isolamento com a família: a atriz Larissa Bracher e os filhos Valentim, de 10 anos, e o mais velho Antônio (o ator Tom Karabachian), de 23 anos, que passa parte do tempo com eles.
Neste período sem que nenhuma outra pessoa entrasse em sua casa, Moska escreveu pouco e não terminou nenhuma composição. Faltou tempo. Sem dispor das horas em aeroportos, vans, aviões, hotéis, ele também tem lido pouco, praticamente só quadrinhos. Uma maneira de contornar a fraca produção da temporada é inovar nas lives que faz, utilizando mais de uma câmera e posicionando-as em ângulos diferentes. Tempo para a experimentação. “Quando as lives acabam, junto as imagens, com a ajuda de amigos, e faço clipes artesanais. Isso me dá a sensação de estar produzindo algo novo e mantém a esperança de que as coisas vão voltar ao ‘novo anormal’”, admite.
A sensação de bloqueio é compreensível. A pandemia interrompeu a turnê do álbum “Beleza e medo” (2018), que ele já havia apresentado no Rio, em SP, Argentina e Uruguai. Depois de dois adiamentos, a previsão de retomada ficou para março de 2021. Outro projeto em suspenso é um novo show, com a parceira Zélia Duncan. Os dois já estavam ensaiando para estrear em abril e ainda não conseguiram definir uma nova data para subir ao palco.
Palco é justamente aquilo de que Moska mais sente falta. Essa abstinência de shows e de tudo que vem junto com eles o desestruturou. Não é para menos, desde os 16 anos – seja como ator ou cantor –, a arte rege sua vida, funcionando como um ponto de equilíbrio: “entrou no meu metabolismo químico e biológico”, explica.
– Meu corpo e minha mente são habituados à dinâmica de show: encontrar equipe, pegar van/ônibus/avião, horas de hotel, passagem de som e, principalmente, a catarse do show, os encontros no camarim… Sempre volto para casa revigorado pelo suor do palco, pela troca de energia. Eu sou isso! – reconhece.
O fazer artístico de Paulinho Moska é múltiplo e passa por histórias, culturas, formas e relações diferentes. Na TV, a série “Zoombido” teve mais de 10 temporadas e promoveu encontros entre o apresentador e mais de 200 compositores. Exibido pelo Canal Brasil, o programa contou ainda com uma edição uruguaia, fruto de sua antiga amizade com Jorge Drexler, de quem é amigo desde 2003.
Sua relação com a América Latina vem sendo construída “tijolo a tijolo”. Inclui a organização dos festivais “Mercosul Musical” (2008) e o “Soy Loco Por Ti América” (2011), ambos no CCBB; e um álbum inteiro (“Loucura Total” / 2015) com o argentino Fito Paez. Tamanha curiosidade e atração resultou na série, ainda inédita, “Tu casa es mi casa”. Com a mesma equipe de “Zoombido”, Paulinho Moska percorreu 12 países, passando uma semana em cada lugar, promovendo, a cada um dos 12 episódios, um encontro entre a ciência e a arte de cada lugar.
– Foi como descobrir um novo Brasil. Em cada país, encontrava três pessoas: um compositor, um artista visual e um cientista com alguma ideia revolucionária. A partir da ideia do cientista, eu e o colega local tínhamos de compor uma música, enquanto o artista criava uma imagem para representar a ideia. Os ícones ficaram tão legais que fiz questão de tatuá-los no antebraço – conta Paulinho, que se identifica com os vizinhos, assim como reconhece a realidade brasileira na dos países latino-americanos.
De volta a seu quadrado, Paulinho Moska acredita que estamos diante de uma pandemia dupla, sendo que “a política é tão ou mais nociva”. Para ele, a vacina – ao menos a possibilidade de uma vacina para todos – ainda vai demorar e ele não se sente seguro de retomar seus passeios a pé ou de bicicleta pela Lagoa ou mesmo para sair para comprar pão na padaria Século XX. O jeito é seguir prestigiando as entregas da Peixaria do Marquinhos, do supermercado Zona Sul e da pizzaria Mamma Jamma: “Tem que ser pertinho para a pizza chegar quentinha”, conclui.
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