Quando a atriz e diretora Debora Lamm se mudou para o Humaitá, em 2005, ela já trazia na bagagem participações em novelas, como “Um anjo caiu do céu” (2001) e “Celebridade” (2003), além de indicação ao prêmio de melhor revelação, em 1999, por sua Bruxinha Caolha, no clássico de Maria Clara Machado “A bruxinha que era boa”.
De lá para cá, ela ganhou fama com inúmeros personagens humorísticos, muitos deles ao lado de Bruno Mazzeo, como nas séries do Multishow “Cilada” (2006 a 2008) e “Junto & Misturado” (2010 a 2013), e em “Muita Calma Nessa Hora” (2010), em que vivia a hippie Estrella, que passa o filme todo carregando uma samambaia. Mais recentemente, Debora conquistou a simpatia do público e nota 10 na principal coluna de TV do país com sua Miranda, na novela “Amor de Mãe”, que, ao saber das traições do marido, exigiu dele um “vale-night”.
Aos 43 anos de idade e 24 de carreira, Debora não para. Entre seus novos projetos estão uma novela, uma oficina de teatro e uma edição comemorativa de “Cilada”, retomando a parceria de sucesso com Mazzeo. Veja, a seguir, os destaques da entrevista dessa boêmia de carteirinha, que já foi homenageada com um prato com seu nome no novo cardápio do tradicional reduto teatral La Fiorentina:
Humaitá
Na época que eu vim para cá, tinha uma galera jovem, estudantes de teatro, começando a morar no Humaitá e em Botafogo. Até hoje, tenho grandes amigos morando aqui, como o Pedroca [Pedroca Monteiro, ator de “Vai que cola”], que é meu vizinho.
A vizinhança aqui é muito heterogênea e cosmopolita, e isso me interessa muito. Você anda pela rua e encontra diversidade. Aqui tem de tudo, não há padrão. Gosto da praticidade de ter exames, médicos, laboratórios até um suco verde de uma barraca de hortifrúti na Cobal, que super recomendo e não vejo em outros lugares. É, realmente, uma região que tem tudo fácil e perto.
Pontos negativos
As calçadas são ruins, estreitas e mal-cuidadas, mas o maior problema é o trânsito, com certeza. Eu não tenho dificuldade de ir de um lugar pro outro porque aqui eu já estou no meio do caminho para qualquer lugar que eu vá. A gente precisa lidar o tempo inteiro com essa questão caótica que é o trânsito carioca. Eu sinto mais como pedestre. Quando saio de casa, já estou inserida ali, mas gosto dessa coisa carioca das esquinas, do chaveiro, do sapateiro, do guardador de carro que está aqui há não sei quantos anos.
Boemia
O bairro é onde acabei fazendo a minha vida mesmo. Tem de tudo, mas gosto, principalmente, dos encontros “pós-peça”, da cultura de sentar num bar e falar sobre o que foi feito ou visto. Finquei raízes em lugares como o Aurora e o Fusca Bar. O Boa Pinga é opção para o “pós do pós”, porque fica aberto até mais tarde.
O Tablado
O Tablado foi muito importante na minha formação, não só como atriz, mas como uma pessoa de teatro. É uma casa, onde você aprende fazendo. Logo na minha primeira aula, o professor já estava no balcão dizendo “não estou ouvindo”. Você entende que para qualquer coisa dar certo ali não basta atuar, precisa de alguém no som, na iluminação, nos figurinos, como contrarregra… Da minha geração, saíram profissionais de teatro, de diretor musical a dramaturgo. Isso é possível porque você está dentro do teatro – não numa sala de aula –, sendo estimulado o tempo inteiro a ocupar todas essas funções.
Sempre que volto lá, tenho a sensação de voltar pra casa, como quando a gente vai na casa da avó e vê aquele porta-retratos com você novinha. No Tablado é a mesma coisa, tem um monte de foto minha na parede fazendo teatro. A gente sente aquele afeto de casa. Temos que cuidar, porque é nossa!
Profissão
Não sei responder do que gosto mais. Cinema, teatro, televisão é tudo muito complementar e muito diferente. Cada formato tem seu grande barato e uma coisa mais difícil mesmo, suas complexidades e suas delícias.
Para tudo, a sensibilidade precisa estar alerta. Numa novela, que é uma obra aberta, a gente tem que ter extrema sensibilidade e disponibilidade, porque você não sabe o que vai acontecer. Já o cinema é uma obra fechada, mesmo que na edição aquilo possa mudar. Exige outro tipo de atenção. Muitas vezes você começa na cena 47 e precisa ter uma organização interna para entender muito bem o caminhar da personagem e perceber o que você está fazendo. Teatro é o aqui e agora por todos os poros. Tudo tem seu barato.
Teatro
Ter começado no teatro me trouxe, principalmente, um senso de coletividade, de olhar para o outro, de entender sobre o quanto o nosso ofício depende do outro. Apesar de toda essa cultura de celebridade, não é uma questão de êxito individual.
Faço parte da companhia OmondÉ, com a Inez Viana, o Jô Bilac e outros. Com “Os Mamutes”, ganhei o prêmio FITA [Festival Internacional de Teatro] de melhor atriz, em 2012, com a personagem Isadora Faca no Peito. Este ano, concorremos na categoria Espetáculo Adaptado ao vivo do prêmio da APTR [Associação dos Produtores de Teatro] com “Mata teu pai”, que estreou no Teatro Municipal Sérgio Porto em 2017 e que, na pandemia, foi remontada no quintal da minha casa.
Espaço Sérgio Porto
Antes de “Mata Teu Pai”, teve “Cock – Briga de Galo”, em 2014 e 2015, e, este ano, voltei ao Sérgio Porto com a peça “A partida”, dirigindo as atrizes Inez Viana e Denise Stutz, com quem vou ministrar uma oficina de teatro lá. “Solos em Processo” vai ocupar o equipamento cultural da prefeitura de 18/10 a 29/11, das 14h às 17h, horários normalmente ociosos do espaço.
Personagens
O cinema e a TV me deram muitas oportunidades na comédia, por isso tenho a honra de ser reconhecida como comediante. Enquanto o teatro dá oportunidade de variar e exercitar outro lado, mais dramático, como a personagem Medeia, da tragédia “Mata Teu Pai”.
Os comediantes geram intimidade, fazer rir é sublime. Alguns personagens que fiz reverberam até hoje, como a minha parceria com o Bruno Mazzeo, no “Cilada”, primeiro trabalho de dramaturgia da TV a cabo, no Multishow.
Outro papel marcante, também com o Bruno, só que no cinema, é a Estrella. Eu vou na esquina e as pessoas lembram da hippie do filme “Muita calma nessa hora” e perguntam “E a samambaia?”, em referência à personagem que andava com um vaso de samambaia na mão. Acho que mais de 50% das abordagens vêm acompanhadas por isso.
Comédia é olhar, muito difícil explicar como fazer. Uma frase como “Olha para essa almofada aqui e diz ‘mamãe’”, da minha personagem no filme “Depois a louca sou eu” [2021], quanto mais sério você fala, mais absurda fica.
Este ano, a personagem Miranda, da novela “Amor de mãe”, teve uma boa repercussão nas ruas, especialmente com as mulheres se solidarizando por causa do “vale night”.
Novos projetos
Em novembro, volto às novelas com a inédita “Quanto mais vida, melhor”, na faixa das 19h, da Globo. Em 2022, eu e o Bruno [Mazzeo] vamos voltar com o “Cilada”, numa edição comemorativa na Globoplay/Multishow, que vai mostrar como o casal está agora. Nós temos mil outros projetos, levamos essa parceria pra vida.
Também no ano que vem, devo fazer uma série mais trágica, mais dramática, mas ainda não posso falar sobre isso.
*Por Betina Dowsley
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