28 de outubro de 2021
UM SOLAR DE MUITAS HISTÓRIAS

Sede de chácara, Asilo Agrícola, Horto Florestal, Fundação Pró-Memória e, hoje, parte do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. O Solar da Imperatriz já foi tudo isso, menos da Imperatriz. Este ano, o imóvel tombado passou a integrar a Trilha do Patrimônio do JBRJ e, em outubro, ganhou visitas guiadas gratuitas. O passeio é abordado a partir do ponto de vista arquitetônico e da adequação do imóvel à Escola Nacional de Botânica Tropical, que, em 2021, está completando 20 anos. Primeira escola do gênero na América Latina, a ENBT funciona no Solar da Imperatriz desde sua criação, mas, atualmente, está com aulas apenas em formato remoto.

Para contar a história do Solar da Imperatriz é preciso, antes de mais nada, esclarecer um equívoco histórico envolvendo seu nome. A confusão deve-se à coincidência de nomes de duas Fazendas do Macaco no Rio de Janeiro: uma no Horto e outra no Andaraí, com a qual Dom Pedro I presenteou sua segunda esposa, Dona Amélia de Leuchtemberg. As duas Fazendas do Macaco eram separadas pelo Maciço da Tijuca, mas seus territórios, apesar de extensos, nunca chegaram a ser contíguos. A Fazenda do Macaco que pertenceu à família Imperial foi vendida ao Barão de Drummond em 1872; enquanto a que ficava no Horto teve sua antiga sede tombada. A denominação equivocada firmou-se a partir da segunda metade do século XX.

O “falso” Solar da Imperatriz, no final da rua Pacheco Leão, tem sua origem associada ao mais antigo engenho de açúcar do Rio de Janeiro, o Engenho Nossa Senhora da Conceição da Lagoa, de 1575. O imóvel e outras 53 chácaras faziam parte da Fazenda Nacional, que se estendia pelos bairros que hoje circundam a Lagoa Rodrigo de Freitas. O imóvel que abriga a atual Escola Nacional de Botânica Tropical foi erguido em 1830. O Comendador Silva Porto comprou a Chácara do Macaco e outros lotes em 1844. O terreno foi desmatado e utilizado para plantações diversas – da cana-de-açúcar ao café, passando por laranjeiras e bananeiras – e produção de lenha e carvão na cidade.

No final da década de 1860, após a morte do Comendador, o governo Imperial requisitou as terras para construção de um reservatório das águas do Rio dos Macacos e seus afluentes e para a criação do Asilo Agrícola, tudo sob a administração do Ministério da Agricultura. O Asilo proporcionava ensino prático agrícola e instrução civil e religiosa a meninos a partir de 8 anos, órfãos pelo menos de pai, e funcionou ali até o fim do Império como área de produção de mudas.

No início do período republicano, a Chácara do Macaco serviu como horto de distribuição de mudas e área de aclimatação de novas espécies vegetais, especialmente eucaliptos, que eram distribuídos para todo o Brasil. A partir de 1911, passou a abrigar o Horto Florestal. Em 1938, o Solar tornou-se sede do Serviço Florestal do Brasil, ao qual cabia proteger as florestas do país, criar e preservar estações biológicas e parques nacionais, promover o reflorestamento e o estudo da flora.

Naquele mesmo ano, o Jardim Botânico foi tombado como Patrimônio Nacional, incluindo a área do Horto Florestal. Entretanto, o processo só viria a se concretizar em 1973, desencadeado por uma mobilização de intelectuais e moradores da região após carta enviada pelo paisagista Roberto Burle Marx ao IPHAN, em 1969, chamando a atenção para a importância da preservação dos recursos naturais e do patrimônio histórico do local. Após sediar a Fundação Pró-Memória por uma década e meia, o Solar da Imperatriz foi fechado para restauração em 1998. O trabalho preservou as características originais do prédio, e o projeto paisagístico de Burle Marx para o jardim da frente foi implantado.

O Solar hoje

O Solar da Imperatriz foi reinaugurado em 2001 como Escola Nacional de Botânica Tropical, a primeira do gênero na América Latina. A ENBT é vinculada ao Instituto de Pesquisa do Jardim Botânico do Rio de Janeiro e oferece cursos de mestrado, doutorado e de extensão, com programas voltados para conhecimento da flora nacional, dos ecossistemas brasileiros e para a conservação das espécies. Nestes 20 anos, a ENBT formou mais de 350 mestres e doutores, além de ter recebido milhares de pessoas em seus cursos de extensão e capacitação. Somente os cursos de Ilustração Botânica tiveram mais de 1.500 alunos. Em 2021, a escola tem 205 alunos inscritos, mais da metade deles nos programas de pós-graduação.

Este ano, o Solar da Imperatriz passou a integrar a Trilha do Patrimônio do Jardim Botânico do Rio, que reúne os principais monumentos e sítios arqueológicos, além de contar a história bicentenária da instituição. Neste mês de outubro, foram realizadas quatro visitas ao Solar, guiadas pela arquiteta e urbanista Dalila Tiago de Mendonça (JBRJ), que apresenta parte da história do casarão, chamando a atenção para detalhes arquitetônicos e paisagísticos que foram considerados ao longo da restauração da edificação:

– O trabalho preservou as características arquitetônicas da antiga sede da Fazenda do Macaco, respeitando ao máximo as cores das pinturas das janelas e da fachada. Além disso, algumas paredes internas foram deixadas sem revestimento, evidenciando as técnicas de execução e materiais da época – explica Dalila durante a visita.

Ao longo do passeio, descobre-se detalhes da recuperação do imóvel (fotos da janela e das paredes, acima, de Federico Rossi) e as adaptações realizadas para sua nova finalidade, que precisaria contar com salas de aula e espaço para a administração da escola. Com isso, a capela da residência virou um pequeno auditório. Já o porão, onde ficava a senzala, foi transformado em cafeteria, que foi pouco utilizada e, atualmente, encontra-se fechada. Entre as ações promovidas pelas obras de recuperação, uma das mais delicadas foi a transferência do piso da capela para a varanda da frente do imóvel. Já o salão de entrada, transformado em recepção da ENBT, teve seu piso de tábuas corridas original preservado. Nas salas, é possível observar outras características da construção, como o pé direito alto e o forro de madeira, além da estrutura das janelas e parte da pintura decorativa das paredes de alguns aposentos.

Limitadas a 15 pessoas por vez, as visitas vêm sendo bastante procuradas desde que foram anunciadas. Um ponto fraco é o traslado do Centro de Visitantes do JBRJ até lá. Apesar de ter por objetivo facilitar o acesso ao local, o transporte é feito em micro-ônibus com ar condicionado (e janelas fechadas!) e está sujeito ao trânsito do bairro. As próximas visitas estão marcadas para os dias 26 e 27 de novembro, sexta e sábado, com horários de manhã e à tarde.

Visita guiada ao Solar da Imperatriz

Datas: sexta-feira (26/11) e sábado (27/11) Inscrições: cvis@jbrj.gov.br / (21) 3874-1808. Gratuito.

Manhã: 9h45 – Ponto de encontro no Centro de Visitantes do Jardim Botânico – Rua Jardim Botânico, 1.008
10h – Saída do micro-ônibus para o Solar da Imperatriz
10h20 – Visita guiada ao Solar da Imperatriz

Tarde: 13h45 – Ponto de encontro no Centro de Visitantes do Jardim Botânico – Rua Jardim Botânico, 1.008
14h – Saída do micro-ônibus para o Solar da Imperatriz
14h20 – Visita guiada ao Solar da Imperatriz

*Texto e fotos atuais: Betina Dowsley

0 comentários

Trackbacks/Pingbacks

  1. OS 200 ANOS DE INDEPENDÊNCIA NO TÚNEL DO TEMPO DO JBRJ – JB em Folhas - […] dirigiu o JBRJ entre 1915 e 1931; o Centro de Visitantes, uma construção do século XVI; e o Solar…

Enviar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Artigos relacionados