Nota dez! Essa foi a avaliação da coluna da jornalista Patrícia Kogut, no jornal O Globo, e de todo mundo que já assistiu à série documental “Meu Amigo Bussunda”, dirigida pelo amigo e parceiro do “casseta” Claudio Manoel. Quinze anos foi o tempo necessário para Claudio Manoel superar a dor da perda e poder dividir com os fãs sua homenagem.
O diretor conheceu Bussunda ainda menino, quando ele era apenas Cláudio Besserman Vianna, irmão mais novo de seus amigos Sérgio e Marcos, do CAp da UFRJ. A amizade dos dois se fortaleceu em 1980, quando ele e Bussunda foram convidados a fazer parte do jornal “Casseta Popular”, criado dois anos antes por Marcelo Madureira, Beto Silva e Helio De La Peña.
A ideia da série surgiu em 2019. Depois de dirigir documentários como “Simonal: ninguém sabe o duro que dei” (2009) e “Chacrinha – Eu vim para confundir e não para explicar” (lançado em janeiro de 2021), nos quais nem sua voz é ouvida, Claudio queria experimentar uma nova linguagem:
– Com “Meu amigo Bussunda” foi o oposto. Eu queria contar uma história em que eu estivesse dentro, de alguém que conhecesse bem – explica o humorista, que chamou Micael Langer, para balancear o que era realmente importante incluir, e Júlia Vianna, filha de Bussunda. – Ela entrou como complemento, para ter algo pós, estabelecendo uma conversa de filha para pai, mostrando a filosofia dele, dando continuidade às histórias a partir de suas lembranças.
O resultado superou as expectativas de Claudio Manoel, que sabia que esse trabalho mexeria com algumas pessoas e atribui o engajamento da equipe e do público à empatia do personagem. O que ele não imaginava é que tudo isso reavivaria o tamanho da perda de uma amizade interrompida subitamente. Tão pouco contava com um processo mais lento, com foco importante na pesquisa, prolongado pela pandemia: “Durante o projeto, convivi de novo com ele e agora preciso administrar a perda novamente”, admite.
Antes de ficar conhecido como Maçaranduba e Seu Creysson, do “Casseta & Planeta, Urgente!”, Claudio Manoel estudou Engenharia, Economia e Comunicação, mas nunca se formou. O programa original ficou no ar de 1992 a 2010. Em 2012, o grupo voltou à telinha com “Casseta & Planeta Vai Fundo” e, em 2016, com “Procurando Casseta e Planeta”, uma espécie de “falso documentário” de 20 episódios único desses programas a ser exibido pelo Multishow. Grande parte do trabalho Claudio Manoel, porém, é atrás das câmeras. Além dos filmes e programas de TV do grupo, ele foi roteirista de “TV Pirata”, “Doris para Maiores”, “Encontro com Fátima Bernardes”, e dos quadros do Fantástico “O que vi da vida” e “Heróis do Olimpo”, tudo isso na Globo.
Morador do Jardim Botânico há mais de 25 anos, Claudio Manoel conhece bem os trechos antes e depois do Parque Lage. Sobre o CAp UFRJ, ele costuma dizer que foi muito mais do que alfabetizado, lá aprendeu a consumir livros e a socializar:
– Naquela época, a gente brincava de esconde-esconde no bairro, jogava bola na praça da igreja de São José e guardava a bola no Pinduca (antigo Bar dos Contentes, onde hoje funciona o hortifrúti Rede Varejão). No colégio, havia, pelo menos, dois ‘feriados’ por ano por conta da mortandade de peixes na Lagoa, ninguém imaginava passear por sua orla – contou ele ao JB em Folhas, em entrevista à coluna Ilustre Morador, em 2015.
Seu primeiro endereço no JB foi um apartamento na rua Von Martius, que dividia com os também “cassetas” Bussunda e Beto Silva, antes mesmo da contratação deles pela Globo: “Daquele tempo, restam poucos estabelecimentos, como o bar Joia e o mercadinho Afonso Celso”, observa.
A única vez que Claudio Manoel se envolveu diretamente com os problemas do bairro foi no início dos anos 2000, quando foi cogitada a instalação de uma faculdade na rua Jardim Botânico, na esquina com a Abade Ramos. Ele contratou um estudo de impacto para a região e compareceu a uma reunião da associação de moradores, que sequer analisou o trabalho. Nunca mais voltou.
O intérprete do personagem marombeiro Maçaranduba nunca gostou de academia e sempre preferiu as atividades ao ar livre. Claudio gostava muito de correr, mas acabou precisando deixar a prática de lado devido a um problema no joelho. A bicicleta passou a ser sua companheira: “Sempre andei muito bicicleta, seja como transporte, seja por esporte. Nos bons tempos, eu e minha mulher subíamos a Pacheco Leão e íamos até o Alto da Boa Vista, passando pela Vista Chinesa”, conta ele, que está voltando a pedalar agora. Ficou traumatizado por ter sido atropelado de bicicleta, no início da pandemia, quando levou 20 e poucos pontos.
A rotina atual de Claudio Manoel é toda no bairro. Nos primeiros seis meses da pandemia, ele ficou em casa direto. Agora, tem se aventurado a ir, de carro, ao escritório, que fica em prédio comercial ainda pouco movimentado no JB. No mais, “continuo mais no delivery, do que frequentando lugares”.
Ao longo de todo esse tempo vivendo no Jardim Botânico, ele lamenta que uma coisa ainda não tenha mudado: a mobilidade. “Não é uma questão exclusiva do bairro, mas de toda a cidade. As pessoas têm de entender que, para ter metrô ou BRT, é preciso fazer obras. Elas atrapalham nossa vida, claro, mas são necessárias”, afirma com a clareza de quem já visitou inúmeras cidades grandes mundo afora e reconhece a urgência de uma rede de transporte público eficiente.
Se o trânsito já voltou à lentidão normal de antes da pandemia, o trabalho não para. Claudio Manoel tem vários projetos na cabeça, mas não se sente à vontade para falar de coisas que ainda não tem certeza se, de fato, vão acontecer.
– Gostaria de tratar de casos na esfera policial, desses que mexem com o imaginário do país. Um desejo é fazer uma doc/série sobre Nelson Rodrigues, um grande pensador da alma brasileira. Sou um leitor apaixonado e conheço outros conhecedores igualmente apaixonados. Acho que poderia gerar uma curadoria legal, à altura do velho Nelson – imagina.
*Por Betina Dowsley
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