15 de outubro de 2020
LEILANE NEUBARTH

Sete anos é pouco para a familiaridade que o rosto da jornalista Leilane Neubarth – moradora do Jardim Botânico desde 2013 – inspira quando circula pelo bairro. Não poderia ser diferente. Ela anda por aqui desde 1979, quando ingressou como estagiária na TV Globo, passando por quase todos os programas jornalísticos da emissora, incluindo Jornal da Globo, Bom Dia Brasil, Globo Repórter e Fantástico. Atualmente, é titular do Jornal da GloboNews Edição das 18h, do qual está afastada devido à orientação da OMS, que estabeleceu que pessoas com mais de 60 anos fazem parte do grupo de risco da COVID-19.

Em mais de 40 anos de profissão – quase todos na emissora –, Leilane nunca havia ficado tanto tempo longe do corre-corre diário, no máximo três ou quatro meses, de acordo com o período de licença maternidade vigente na época. A última edição do jornal apresentado por ela foi ao ar em 20 de março. Desde então, alternou momentos de angústia, depressão e esperança. Num primeiro momento, ela ficou trabalhando de casa, de onde fez matéria sobre a morte de Moraes Moreira; entrevista com a prefeita de Barcelona, Ada Colau, no auge da pandemia naquela cidade; e inúmeras outras reportagens que acabaram não indo ao ar devido aos temas urgentes que o jornal não podia deixar de noticiar.

– No começo fiquei muito angustiada de viver um momento importante para a humanidade e não poder estar participando. Ficava com duas tvs ligadas o dia inteiro, uma na Globonews e outra na CNN. Sofri uma intoxicação de notícias. Meu trabalho sempre me deu muitas alegrias e orgulho por estar na primeira fila dos acontecimentos e estar longe disso me deprimia – reflete.

Para não enlouquecer dentro de casa, onde passou os três primeiros meses em rigorosa quarentena, Leilane decidiu tirar um mês de férias, vencidas no ano passado. A estratégia foi boa. Como não estava trabalhando, ela conseguiu se desligar um pouco e criar uma rotina menos intensa para encarar uma nova fase, com tempo para ler, ver séries, fazer exercícios e permitindo-se acompanhar os noticiários de manhã e no final do dia, mas sem ficar presa a eles. Na volta de seu sítio na serra, começou a sentir-se segura para retomar, aos poucos, suas atividades, como ir ao mercado e à academia Stella Torreão, onde encontrou toda a equipe muito preocupada e cuidadosa com os novos protocolos de higiene e segurança. Leilane já voltou também a correr 5 km na areia fofa da praia e a percorrer a orla, do Leblon ao Leme, de bicicleta.

– Incluindo o trajeto da minha casa até a praia, ida e volta, são 28 km. O pior é o sprint final para subir a minha rua – observa ela, que costuma fazer isso três vezes por semana.

De máscara na academia Stella Torreão

Até agora, convidou apenas uma amiga para ir à sua casa. As muitas outras, como a atriz Cissa Guimarães, aceitaram jantar juntas, cada uma em sua casa, graças ao Facetime (aplicativo de chamadas de vídeo). Recentemente, depois de seis meses sem ver o neto, conseguiu matar um pouco as saudades. Nas pequenas saídas que vem fazendo, chamou a atenção da jornalista o fato de as pessoas – de crianças a idosos – estarem usando máscaras no Jardim Botânico. São pequenas alegrias que trazem muita felicidade, como as voltas de moto (com direito capacete e máscara) para ver o mar.

Por muitos anos, Leilane morou em Ipanema, para onde ainda corre para comprar um presente. Aqui, é freguesa das Casas Pedro, Multicoisas e Antonio Bernardo; e ficou animada ao descobrir a loja de consertos de roupa Costura da Dorinha, na JJ Seabra, perto da saudosa livraria Ponte de Tábuas. Os restaurantes do JB, um de seus programas favoritos no bairro, têm feito falta, assim como uma tradicional paradinha para cumprimentar amigos – como o artista plástico Luiz Zerbini, o jornalista Eric Nepomuceno, a coreógrafa Deborah Colker e os músicos Toni Platão e Jards Macalé – no Bar Rebouças.

– Achava que Ipanema era o meu lugar, mas, hoje, acho difícil sair daqui. A Lopes Quintas é a minha praia, sempre descubro uma coisa bacana nas lojinhas da rua, como um adereço de cabeça para o Carnaval ou um vinho para uma ocasião especial – destaca ela, que, certa vez, na correria do plantão de final de ano de 2018, esqueceu de tirar o microfone para ir à loja da Grand Cru escolher uma garrafa para o Réveillon.

Leilane de microfone na loja Grand Cru

Às vésperas de eleições municipais, Leilane considera dois pontos fundamentais. A segurança vem em primeiro lugar, para poder andar na cidade e usufruir de suas belezas. “É um privilégio viver cercada pela floresta e tão perto da Lagoa. Para mim, um ambiente seguro passa também pelo cuidado com as ruas, a iluminação pública e os jardins”. A Educação – com E maiúsculo mesmo – é outro aspecto valorizado pela apresentadora: “Sem ela, não se vai a lugar nenhum. Ler e escrever é fácil, é preciso formar cidadãos críticos e conscientes”, afirma.

Para ela, a função de todos deveria ser melhorar a rua, o bairro, cuidar das pequenas coisas: “Falta consciência, vejo pouco engajamento em tudo, inclusive nas coisas do bairro, para o qual poucos trabalham e muitos criticam. Participo de vários grupos de WhatsApp, do prédio e da rua, e certa vez um arquiteto propôs um projeto para parquinho infantil na praça no final da rua. Foram tantas críticas e objeções que ele desistiu”, lamenta.

As ideias são muitas e ela vai escrevendo, gravando vídeos, entrevistando e sendo entrevistada em lives, adaptando-se ao universo digital. No fim das contas, o período tem sido de renovação, como um ano sabático. Seu foco atual é a longevidade, tema que começou a estudar para um projeto do GNT voltado para os “novos velhos”: “Há muita falta de respeito com os velhos e, com a pandemia, a discriminação piorou muito”, admite, lembrando que “quem não morre, envelhece”.

– Admiro muito a jornalista da CNN Christiane Amanpour, que fez a série “Sex and Love Around The World”, disponível no Netflix, mostrando como os temas são abordados em diversos lugares do mundo. Se não tivesse limite de orçamento ou censura, adoraria desenvolver um projeto parecido, falando sobre o envelhecer do ponto de vista físico e cultural em vários pontos do planeta – anuncia.

*Por Betina Dowsley

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