O produtor cultural, ator e DJ Rodrigo Penna vai debutar na próxima semana. Ou melhor, o Bailinho, festa que ele criou em 2008, está completando 15 anos. E a comemoração vai ser em alto estilo, como a data merece, dia 19 de janeiro, quinta-feira, no salão da Tribuna de Honra do Jockey Club Brasileiro. Motivos não faltam, afinal foram cinco anos sem a festa carioca que invadiu outras cidades, como São Paulo e Brasília.
– Eu já tinha feito um Bailinho no Jockey, mas em uma área aberta e agora quis estrear na Tribuna, onde acontecem os eventos da Sociedade Brasileira para fazer um grande baile, como a ocasião merece -, explica Rodrigo que fez edições memoráveis, sempre com convidados especiais nas carrapetas, no Píer Mauá e na varanda do MAM onde, inclusive, a atual Ministra da Cultura, Margareth Menezes, deu uma canja como DJ.
O debut do Bailinho vai ser com toda pompa e novidades. O evento que sempre investiu em cenografia chega com tudo novo, da cabine de DJ ao altar dos santas, além de brindes diferentes. Além disso, o espaço vai contar com uma segunda pista, onde acontece o Chuveiro in Concert, projeto de karaokê da Érika Martins, com uma banda ao vivo. E depois das 2h da manhã, o Bailinho vira Inferninho, com um set de música eletrônica.
Rodrigo Penna em momentos das suas festas, Bailinho e Alento.
Mas que os seguidores da festa não se animem, porque o retorno é pontual, apenas para comemorar os 15 anos, pelo menos por enquanto, como avisa o produtor. “Eu parei com o Bailinho em uma época que o Brasil estava muito pesado, vivíamos um momento que ia contra tudo que o evento defende. Levantamos diversas bandeiras: a da diversidade, que toda forma de amor vale a pena, a liberdade de religião, de crença, a mistura como fator essencial brasileiro.Não sei se a festa volta de vez, vou sentir o clima e viver um dia de cada vez.”
E para os que não entendem a diferença entre as festas Bailinho e Alento – festa que aconteceu no ano passado nos jardim da Casa Camolese, Rodrigo tenta explicar: “Alento é um passo adiante, foi criado em outro contexto, era para ser mais calmo e não foi; tinha uma pegada mais ativista, seguindo o momento político da época. O que está me instigando é ver como o Bailinho dialoga nos tempos atuais. Quando comecei não tinha festa pop e o reinado era do eletrônico.”
Rodrigo e alguns dos DJs convidados do Bailinho: Bochecha, Margareth Menezes e Nelson Motta.
O DJ E SEU MASH UP CULTURAL
Nascido e criado no Jardim Botânico, Rodrigo Penna se considera meio mineiro (costumava passar férias em Ouro Preto e outras cidades do interior), meio carioca, com um pé na Gávea e outro no Humaitá. Ou, melhor dizendo, na Fonte da Saudade, onde mora há 10 anos, mantendo-se próximo às casas da irmã, no Humaitá, e da mãe, no JB. E essa mistura de cidades influenciou a sua formação profissional. Ele começou como ator aos oito anos de idade e aos 12 encenou a peça “Menino Maluquinho“. Fez várias novelas e séries, como “Sob Pressão”, da Globo e “Todas as Mulheres do Mundo”, da Globoplay. Acabou seguindo o caminho da música e se realizou como DJ, criando seus próprios eventos. Mas a arte de interpretar continua presente. Tanto que no meio do ano passado fez uma participação na novela “Cara e Coragem”, da TV Globo. “Foi ótimo reencontrar amigos queridos. E a novela tem uma importancia por ser a primeira a reforçar o protagonismo negro na TV”, declarou.
O DJ aproveitou a pandemia para reformular o Projeto Ambiente, que nasceu em 2001 e passou por estabelecimentos como a Melt, no Leblon, e o Caroline Café, no JB. Em formato de sarau on-line, as oito edições do evento deram voz a artistas de diversas vertentes, como a cantora Zélia Duncan, o ator Marcos Palmeira e os artistas visuais Cabelo e Batman Zavareze, e podem ser conferidas no canal do YouTube Bailinho Festa. Rodrigo fez a curadoria, produziu, dirigiu, leu e fez a trilha sonora.
Como morador, Rodrigo foi entrevistado, junto com a irmã, a produtora de conteúdo digital Adriana Penna, em novembro de 2007, na edição 27 do JB em Folhas, onde já falava do seu gosto por andar pelas ruas do bairro encontrando os amigos. De lá para cá, ele continua circulando, mas agora de lambreta, mas o roteiro sempre inclui paradas na Maria Angélica, onde costuma frequentar a Janela Livraria e o Enredo Café.
– Sou ‘lambreteiro’ e, de vez em quando, saio para dar uma volta, ouvindo música. É uma tristeza ver a quantidade de moradores de rua. São verdadeiros acampamentos, tem geladeira… Você vê que são pessoas que não moravam na rua antes. As praias ficaram mais “brancas”, percebo isso também nas minhas festas, nas quais a maioria dos negros está trabalhando e os brancos, se divertindo. -, reflete ele.
Neste contexto, a avaliação do profissional da cultura é que o Jardim Botânico ficou metido à besta, com tudo caro, do aluguel e IPTU aos estabelecimentos comerciais: “Até as feiras aqui são mais caras”. E disso ele entende bem, pois frequenta todas, da Gávea ao Humaitá. Sua favorita é a da Frei Leandro, aos sábados. Chega a ir duas vezes, uma bem cedinho para comprar peixe, voltando mais tarde para todo o resto: “Amo a hora da xepa! Sou amigo de feirantes e até padrinho de casamento de um deles. Antigamente, a feira da Lineu era mais cara, agora isso inverteu”, avalia ele, que faz compras também no Farinha Pura, na Cobal do Humaitá.
Rodrigo e o Andre, na feira da FreiLeandro. E o ator em ação em novelas e séries da TV Globo.
Rodrigo reconhece que a elitização e branqueamento da Zona Sul não é de hoje. Ele passou os 10 anos anteriores à sua mudança para a Fonte da Saudade na Maria Angélica e acompanhou o início da transformação da rua em polo gastronômico, com a chegada da pizzaria Capricciosa e do Mr Lam, além da construção da academia Body Tech. Curiosamente, o estabelecimento que deixou marcas mais profundas no ator e DJ foi o que teve vida mais curta: o japonês Nakombi, que antecedeu o Frontera e, agora, o Hortifruti.
Ele lembra que sua vida virou um inferno devido à falta de respeito do restaurante com a vizinhança: “Tinha bate-boca todo dia”. O problema é que o restaurante insistia em promover shows no segundo andar, cujo telhado se abria sempre que não estava chovendo. A “serenata” incomodava tanto que o levou a criar um flash mob, quando ações desse tipo ainda não tinham nome: numa sexta-feira, convocou cerca de 30 amigos e atores, que compareceram vestindo camisa social branca e gravata preta, a fim de parecerem ser manobristas: “Quando os carros paravam, íamos lá, pegávamos a chave e colocávamos numa mesa. Como resultado, a rua parou por duas horas e eu acabei sendo processado pelo dono do Nakombi”, conta o ator.
Saudoso de sua infância no Horto, Rodrigo sente falta dos amoladores de faca, compradores de ferro velho e vendedores de pamonha e vassoura, que não passam pela Fonte da Saudade: “Adoro a sonoplastia de todos eles, tenho todos esses áudios gravados. Não sou cliente, só gosto do barulho mesmo”, revela ele, que tem como hobby colecionar samplers (arquivos de áudios).
A identificação de Rodrigo com o Jardim Botânico passa mesmo pela tradição. Sempre que passa pela rua J.J. Seabra, recorda-se da Livraria Ponte de Tábuas e do cineasta Eduardo Coutinho sentado na mesa ali fora. Os bares Joia e Rebouças são referências de boêmia para ele. Neste último, ele costumava encontrar o fotógrafo e designer Cafí. E se tivesse que escolher uma música que representasse o bairro, Rodrigo escolheria “Luz dos olhos”, interpretada por Nando Reis (autor) com Cássia Eller. “É difícil escolher uma só, mas não sei porque me vem esta música na cabeça algumas vezes quando passeio pelo bairro”, completa.
Publicada em 26/12/21. Atualizada em 12/01/2023
📷 Chris Martins (Livraria Janela) e divulgação
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