Qual é o símbolo mais marcante do Restaurante Guimas para você? O display de garçom de madeira na entrada, as mesas com toalhas de papel e giz de cera, os desenhos nas paredes, o couvert com patê da casa e queijo Boursin, a caipivodka de lima da pérsia, o arroz de pato, os garçons, como o Chiquinho, que virou gerente e faz parte do dia a dia da casa há mais de 30 anos… Difícil escolher um. São 40 anos de muitas histórias. Apesar de alguns episódios tristes, o que ficou marcado na vida de amigos e clientes do Guimas são os momentos felizes, de celebração, como a que acontecerá na próxima sexta-feira, dia 10/12, quando o restaurante completa 40 anos de atividades.
O restaurante foi criado por quatro amigos, os casais Chico/Maria Cristina Mascarenhas (Tintim) e Ricardo/Priscilla Guimarães. A ideia surgiu durante um almoço em Petrópolis, quando Chico preparou seu tradicional filé mignon, que virou o famoso “Filé do Chico”. Ricardo ficou encantado com o que experimentou e convidou o amigo, e suas respectivas esposas, para uma aventura: abrir um restaurante, mesmo sem experiência no ramo. Assim surgiu o Guimas, combinando as sílabas iniciais dos sobrenomes do quarteto (‘Gui’ de Guimarães e ‘Mas’ de Mascarenhas). A casa adaptou o estilo bistrô francês ao modo de vida carioca, aliando cozinha internacional e clima despojado, e segue atraindo vizinhos, amigos, artistas e profissionais liberais até hoje.
Uma das marcas do restaurante que resiste até hoje são as toalhas de tecido xadrez, cobertas por papel, sempre acompanhados por um potinho com lápis de cera. O que era uma solução para o alto custo de lavanderia logo ganhou outras funcionalidades, como rascunho da divisão de conta, bilhetinhos, projetos de casa e de viagem e até partitura de música. Muitos dos desenhos foram parar nas paredes da casa, com assinaturas de craques, como Angeli, Chico Caruso, Miguel Paiva e Angelo de Aquino. São tantos, que é preciso alternar os que ficam em exposição.
– O Guimas tem praticamente a mesma idade do Projeto Portinari. Este ainda engatinhava quando eu passei a frequentar assiduamente o restaurante, época de Dona Madalena, Chico, Ricardo, Priscila, e nossa amada Tintim… Os garçons que se tornaram amigos, a caipivodka de limão, o desenhar nas toalhas de papel. Guardo ainda um montão daqueles desenhos, muitos dos quais dedicados à nossa filha Maria Candida, que passou a ser frequentadora também. Ela adorava as batatas fritas e o couvert – lembra João Candido Portinari, filho de Candido Portinari e diretor-geral do projeto criado por ele para resgatar e preservar da obra do célebre pintor.
Nos áureos tempos, o Guimas chegou a contar com filiais em Ipanema, no Barra Shopping e no Fashion Mall, a de maior sucesso. A crise financeira do Rio de Janeiro e a violência levaram ao fechamento das mesmas anos depois, mas os fatos que causaram maior impacto no funcionamento interno da casa foram a morte dos sócios Ricardo (2009) e, especialmente, a de Tintim (2014), que foi vítima de crime conhecido como “saidinha de banco”. O evento chocou a Zona Sul do Rio de Janeiro, especialmente os moradores da Gávea, que organizaram uma homenagem à amiga, vizinha e empresária na praça Santos Dumont, onde o crime aconteceu.
A superação de tudo isso ganhou reforço com o título de Patrimônio Cultural Carioca, obtido pelo restaurante em 2016. Na época, Domingas Mascarenhas (filha de Chico e Tintim) estava à frente do restaurante. Com a mudança da primogênita para Portugal em 2018, a segunda filha do casal, Luisa, assumiu o posto. No ano seguinte, a caçula Isabel comprou a parte de Priscilla Guimarães, transformando o Guimas em negócio exclusivo da família Mascarenhas.
– Nossa equipe é ótima, são quase 40 funcionários, divididos no escritório, na cozinha de apoio e no restaurante propriamente dito. Tudo é feito na casa, dos biscoitinhos aos molhos. A exceção são os pães, que sempre foram produzidos pela turma da padaria Gávea’s House, que hoje, está na Panificação Lagoa, na rua Jardim Botânico – revela Bebel Mascarenhas, que, aos poucos, está modernizando a administração do maior patrimônio da família.
Uma das peças-chave para o bom funcionamento do restaurante é Francisco Moura Gomes, o Chiquinho, um dos funcionários mais antigos. Ele lembra que já era garçom na Tijuca e foi levar um rapaz para uma entrevista no Guimas, porque, na época, ele não sabia andar na região: “A dona [Maria Cristina Mascarenhas, a Tintim] simpatizou comigo e me convidou para trabalhar também. Isso foi em dezembro de 1986, e eu comecei em janeiro de 1987. Como não pedi para entrar, nem penso em pedir para sair”, admite o gerente, que já foi “retratado” por Chico Caruso.
Bebel conta que, na pandemia, demitiu apenas três funcionários, sendo que um era aposentado e foi beneficiado com a demissão; e o segundo, Zequinha (José Francisco Vasconcelos), barman desde 1982, que já foi readmitido. Ela lembra que, no período inicial, os garçons viraram entregadores e ficavam com a taxa de entrega para complementar o salário. Atualmente, o Guimas trabalha com os aplicativos, mas implantou seu próprio sistema de entrega, com dois funcionários só para isso. As opções do cardápio e a capacidade máxima da casa seguem reduzidas, pois, segundo ela, os clientes voltaram confiando no espaçamento entre as mesas: “Com a licença da frente de loja, instalamos mais mesas e cadeiras na área externa, delimitada por cerca de palha e piso com tapete de grama sintética, compensando as mesas “perdidas” no interior do restaurante”, observa Bebel.
Os eventos são parte da história do Guimas, que já fazia o catering para empresas, lançamentos de livros e vernissages. O serviço agora chama-se Guimas em Casa e já está recebendo encomendas para ceias de Natal e Réveillon. Este ano, o restaurante participa pela segunda vez do Rio Gastronomia com estande próprio, onde estarão à venda croquetes, arroz de pato, bacalhau a Brás e sanduiche de camarão roll, além da famosa Mousse de Chocolate da Lulu, receita de Luísa Mascarenhas, que estudou no Cordon Bleu e é responsável por essa e outras sobremesas do restaurante.
Para o mês de aniversário, a casa propõe uma releitura do cardápio. Com “Novidades 40 anos – Receitas de Família”, produtos sazonais, como o ceviche de salmão e a salada de siri, passam a integrar o menu – ainda que temporariamente – ao lado dos tradicionais Arroz de Pato do Chico e Moquequinha do Guimas, além de sobremesas como o Toucinho do Céu e o Folhado de Morango.
A festa continuará em 2022, quando será lançado um livro comemorativo com fotos de Luiz Garrido, textos do jornalista Alfredo Ribeiro e design de Sergio Liuzzi, que frequentam o lugar desde o início.
– Adoro o Chico. Nossa amizade é longa, conheci as três filiais e agora vejo as meninas guerreando para manter a casa. Mais do que um restaurante, o Guimas sempre foi um ponto de encontro no Rio de Janeiro. Muitas vezes eu ia lá só para bater papo e encontrar os amigos – confessa Garrido, que vai fotografar as toalhas de mesa de papel desenhadas por artistas que frequentaram o lugar ao longo desses 40 anos.
Guimas Restaurante
Endereço: R. José Roberto Macedo Soares, 5 – Gávea
Telefone: (21) 2259-7996
*Por Betina Dowsley
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