O ano de 2021 deveria ser de festa. Em abril, é comemorado o centenário de nascimento de Maria Clara Machado, que fundou o teatro O Tablado há 70 anos. As efemérides foram anunciadas por Cacá Mourthé, sobrinha e diretora do misto de escola, companhia e teatro, durante a primeira live JB em Folhas e Histórias, realizada em fevereiro deste ano.
Fundado em 1951 como um “grupo de teatro amador” por 16 artistas e intelectuais liderados pela mineira Maria Clara Machado, O Tablado começou numa sala cedida pela obra social Patronato Operário da Gávea, entre a Lagoa Rodrigo de Freitas e a rua Lineu de Paula Machado. Mesmo pequena, a sala contava com um pequeno palco para apresentações e outras atividades de recreação e entretenimento. Como havia poucas cadeiras para acomodar o público, o padre da igreja São José emprestava alguns bancos. As poltronas foram compradas três anos depois, com a renda da peça “Nossa Cidade”, de Thornton Wilder, protagonizada pela própria Maria Clara.
A história d’O Tablado se confunde com a da própria Maria Clara. Com o tempo, ela trocou o palco pela coxia e consagrou-se como a maior autora de teatro infantil do país, graças a peças como “O Boi e o burro a caminho de Belém”, auto de Natal de 1953 (foto); e “Pluft, o fantasminha”, de 1955, indiscutivelmente seu maior sucesso. Depois do fantasma que tinha medo de gente, a dramaturga criou personagens originais, como uma bruxinha boa, um cavalinho azul, dragão verde, até um vento amigo e libertador… Ao todo, Maria Clara escreveu 12 livros, seis espetáculos voltados para o público adulto e 29 infantis, traduzidas em vários idiomas. Sua última peça foi “Jonas e a baleia”, escrita com Cacá, em 2000, um ano antes de sua morte, aos 80 anos.
Além de Cacá, sua mãe Aracy (antiga professora) e seu filho Pedro Kosovski (professor, ator, autor e diretor), a família Tablado conta também com a de Mônica Nunes, que há 24 anos trabalha na Secretaria do curso. Muito antes disso, porém, o Tablado já fazia parte de sua vida. Filha de dois fundadores que estiveram ligados à instituição até 2002 – Eddy Rezende Nunes e João Sergio Marinho Nunes, respectivamente Diretora-Tesoureira e Diretor-Presidente –, Mônica é afilhada de Maria Clara e o teatro é sua segunda casa. Ela fez aula, se apresentou, vendeu cartazes das peças e livros da madrinha. O amor e o carinho pelo teatro foram passados naturalmente para suas filhas Vitória e Elisa. Esta última segue o mesmo caminho, garantindo a renovação do espírito livre e mágico, que é a cara do Tablado:
– Eu não sei o que é a vida sem O Tablado. Essa casa representa o cenário da minha própria vida e me viu descobrir o mundo: comecei a andar naquele palco, a ver artistas naquele palco, a beijar naquele palco, a iluminar aquele palco e ser por ele iluminada. É onde me descobri artista, fiz amigos que são uma verdadeira família e vivi os momentos mais lindos e festivos de minha própria peça – declara Elisa, de 21 anos.
Os cursos de improvisação começaram em 1964 e formaram muitos de seus futuros professores. Foi o caso de Bernardo Jablonski, Carlos Wilson Damião, Guida Vianna, Sura Berditchevsky, Lionel Fischer e Louise Cardoso, além da própria Cacá Mourthé, entre outros. Com o passar do tempo, O Tablado consagrou-se como um dos principais centros de formação de atores do Brasil, com mais de cinco mil alunos, revelando Chico Diaz, Camila Pitanga, Leandra Leal, José Lavigne, Ernesto Piccolo, Maria Clara Gueiros e Cláudia Mauro, para ficar apenas nos já entrevistados pelo JB em Folhas.
O Tablado pode até ser amador, mas, para mantê-lo vivo, é preciso uma boa dose de profissionalismo. Desde 2003, Cacá Mourthé está à frente do teatro, normatizando processos administrativos, buscando patrocínio, montando espetáculos e, sobretudo, mantendo o curso ativo. Naquele mesmo ano, conseguiu o tombamento provisório da instituição, em reconhecimento a seu valor cultural. Outra de suas importantes conquistas foi possibilitar a obtenção de registro profissional provisório a seus alunos.
Todos os anos, o período de inscrições é concorrido. Com a pandemia, a relação candidato-vaga caiu um pouco, e as aulas e o tradicional Festival de Verão precisaram passar para o universo digital. Segundo Ernesto Piccolo, um dos atuais professores da instituição, “a experiência tem sido positiva, por possibilitar o aprendizado em relação à câmera, um fator muito importante para os atores”.
O novo ano letivo teve início em março 2021 e conta com 480 alunos e 19 turmas. A expectativa era voltar ao formato presencial, mas o agravamento da pandemia adiou os planos. Assim que for possível, as aulas no teatro, em pequenos grupos, serão retomadas:
– Este ano está difícil programar eventos. A ideia é produzir uma nova montagem de “Tribobó City”, com grandes atores que começaram suas carreiras no Tablado ao lado de novos talentos e alunos. Em 2022, vamos comemorar não só os 100 anos da Clara e os 70 do Tablado, mas também a reabertura dos teatros! – garante Cacá (foto).
Até lá, o canal do Tablado no YouTube conta com vários espetáculos e depoimentos de alunos e professores que passaram por lá.
O TABLADO
Rua Lineu de Paula Machado 795
Contato: curso@otablado.com.br / (21) 97500-7281 (What’sApp) / (21) 2294-7847.
*Por Betina Dowsley
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