Por Christina Martins
“A gente não tem tido sorte com os últimos governos. O Rio de Janeiro está abandonado e esse descaso acabou afetando o bairro do Jardim Botânico, que, na minha opinião, poderia ser muito melhor, porém foi deixado de lado”. Esta é a conclusão de Miguel Paiva, diretor de arte, chargista, escritor, ilustrador, roteirista – de teatro, cinema e TV – e artista plástico.
Criador dos personagens Radical Chic e o Gatão da Meia Idade, que marcaram uma época (e gerações) e acabaram virando série de TV e filme, respectivamente, Miguel completa 72 anos de idade agora em janeiro e começou a escrever aos dezesseis anos, para o Jornal dos Sports. Depois foi trabalhar no jornal de humor carioca O Pasquim, como assistente de Ziraldo e seguiu marcando presença com seus desenhos nos principais veículos do país. Atualmente está contratado pelo Brasil 247, portal de notícias e análise política. Versátil na profissão, ele afirma que não tem preferência em escrever ou desenhar, depende do momento. “Tenho curtido mais fazer charges atualmente. É o o que está me seduzindo neste contexto político que o Brasil está vivendo.”, confessa ele, que se adaptou bem ao mundo digital e usa o seu perfil nas redes sociais muitas vezes para testar suas criações antes de publicá-las. Inspirado pela posse de Lula, ele fez uma charge com todos os representantes brasileiros que subiram a rampa do Planalto envoltos pela faixa presidencial (foto), que chamou a atenção e foi bastante repostada.
Miguel e a charge inspirada na posse de Lula
O cartunista foi entrevistado pelo JB em Folhas pela primeira vez em 2006, na edição 15, quando o filme “Gatão de Meia Idade”, estava sendo lançado e contou com filmagens na região. Na época, ele tinha se mudado para o bairro pouco tempo antes, quando veio morar com a atriz Ângela Vieira, sua atual mulher, e estava encantado com o verde e a natureza do JB. O artista ainda vê beleza por aqui, mas destaca o descuido com ela. A começar pelo parque que dá nome ao bairro.
– Esta gestão do Jardim Botânico foi hostil aos moradores e extremamente comercial. Fecharam a entrada da Pacheco Leão sem dar nenhuma satisfação e ficaram pensando apenas no lucro. Além disso, usam o soprador de folhas, que faz um barulho enorme e bem cedo. Fico imaginando como isso deve afetar a fauna do parque. Eles, que são tão cheios de regras, deveriam pensar nisso – alerta Miguel, que aproveita para chamar a atenção para o desmatamento no Horto, feito pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). “O que estão fazendo ali é um crime. E afeta a todos os moradores, não apenas o Horto” afirma.
O aumento de camelôs e de moradores em situação de vulnerabilidade pelas ruas do bairro é uma questão séria e responsabilidade das autoridades municipal e estadual. Assim como é preciso trazer as lixeiras de volta para as ruas e fiscalizar as obras. Miguel lembra que a Light passou um ano fazendo um reparo perto da sua capa e quando acabou, ele procurou o encarregado e avisou que aquele recapeamento não ia funcionar. “O rapaz disse para eu não me preocupar, que ele sabia o que estava fazendo. Mas o trabalho ficou uma porcaria e cada vez que o caminhão passava, parecia que o mundo ia desmoronar”, explica ele.
Apesar dos problemas presentes no bairro, Miguel exalta o clima de confraternização que o Jardim Botânico possui. Gosta de resolver sua vida perto de casa, no Horto e está sempre circulando de bicicleta, seja para ir à academia Smartfit ou passear pela Lagoa. Só lamenta a condição da ciclovia, que precisa de uma reforma urgente e a falta de linhas de ônibus em bom estado. Para ele, o tesouro do Jardim Botânico está no relacionamento entre seus moradores.
“O bairro não é maior que as pessoas, mas para que isso continue, precisamos impedir a deterioração da região. Por conta desta preservação se criou uma resistência que une os vizinhos. É muito bom ver ainda, depois de 20 anos, este jeito de cidade de interior, onde muitos se conhecem pelo nome.
Como consumidor do bairro, ele prestigia o comércio no seu entorno: frequenta o salão Globo, na Von Martius e compra seus pães no supermercado Zona Sul. Gosta de jogar conversa fora com o amigo Davi Pinheiro na Padaria Século XX. Os encontros resultaram no “Papo de Padaria”, em que o ator apresentava textos curtos do roteirista em suas redes sociais, que aconteceram de novembro de 2021 a abril de 2022.
Globar Restaurante
Na linha gastronômica, o roteirista marca presença nos restaurantes Prosa na Cozinha, JoJô Bistrô e Globar. “Gosto muito dos meninos que atendem e vira e mexe eu tô lá. Almoço muito com a Ângela e com os meus filhos. Tem esse clima de restaurante local, sem pretensão, é gostoso e super fresquinho”, afirma. Das novidades na região está aguardando a abertura da doceria Absurda, e, ultimamente, tem encomendado bagels com o vizinho e amigo João Camargo.
Saudosista, Miguel lamenta a falta dos guardas de trânsito nas ruas. “A gente reconhecia e cumprimentava todos eles. Hoje não há mais guarda e as pessoas avançam os sinais. Eu ando de bicicleta o tempo todo e estou sempre preocupado com a minha segurança”, confessa. Mas o que o designer realmente quer é que a normalidade retorne ao parque que vê pela janela de sua casa e faz um apelo: “Espero que o Jardim Botânico volte a ser como era antes”.
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