12 de outubro de 2023
À MESTRA LEDA, TODO CARINHO

Foto capa: Chris Martins

“Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo.” Há pessoas que passam suas vidas colocando em prática esse ensinamento de Paulo Freire. É o caso de Leda de Castro Pellegrini, de 91 anos. Dona Leda, como é conhecida pelos alunos, dedicou quase metade de seu tempo no mundo ao ensino, tendo trabalhado por quase 45 anos em duas escolas tradicionais da Zona Sul do Rio: o Souza Leão, onde foi professora, coordenadora e diretora, e o Espaço Educação, que ajudou a fundar. “Até hoje convivo muito com meus alunos. Estou sempre em contato com os mais jovens. Saímos para tomar café, lanchar e conversar”, revela a educadora.

Leda, quando jovem, trabalhou no colégio ao lado do Parque Lage (Foto: acervo familiar)

A história de Dona Leda começa em Alto Caparaó, pequeno município de Minas Gerais, localizado na zona da mata. A cidade é conhecida pelo seu Parque Nacional, que abriga um dos pontos mais altos do país: o Pico da Bandeira, que tinha a flâmula nacional hasteada em seu topo, a 2.892 metros de altitude. “Um dos meus passatempos favoritos durante a infância era apreciar a bandeira do Brasil no alto da montanha. O ar era tão puro, que eu conseguia enxergá-la lá de baixo”, recorda.

 


A família Fernandes em momento de carinho com Leda (Foto: Ana Carolina Fernandes)

Mas, é do outro lado do Maciço da Tijuca, no Jardim Botânico, que Leda começou a escrever sua história com a educação. Em 1960, iniciou sua carreira no extinto Colégio Souza Leão, que ocupava duas casas ao lado do Parque Lage, no número 266 da via principal do bairro. Ali, trabalhou como professora da educação Infantil e do Ensino Fundamental por anos e marcou época, sendo lembrada até hoje.  Na abertura da exposição “Na Infância”, do ator Chico Diaz, em setembro passado, a chegada de Dona Leda causou alvoroço entre os convidados.  A começar pelo anfitrião e a irmã Maria, que anunciavam aos presentes a chegada da querida professora. Além de ter lecionado para boa parte da família Diaz, Dona Leda também é reconhecida com carinho por outra família da região, como a do jornalista Hélio Fernandes, que morou no bairro até sua morte, em 2021.  

– Ela foi uma diretora mãe, teve um papel muito importante para todos nós, não só os daqui de casa, mas de outros amigos. Temos uma gratidão enorme por ela. – afirma a estilista Maria Diaz que assim como Chico, também estudou no Souza Leão, sob os cuidados de Dona Leda.

Maria, Kike e Chico com Leda (Foto: Ana Carolina Fernandes)

O Souza Leão foi um colégio que marcou e ficou conhecido por adotar um currículo menos tradicional, com aulas de teatro e música, além de ser em tempo integral. “O dever de casa era feito na escola, por conta do horário. Nós queríamos que o aluno se dedicasse a si mesmo em casa”, lembra Dona Leda, que gostava de passear com os alunos pelo bairro, para ele aprenderem a se localizar. Ela apresentou para muitos o Parque Lage, a colônia de pescadores e o mangue, na Lagoa. E tem na memória algumas situações inusitadas que viveu. “Certo dia, uma cobra coral escalou o muro e entrou na sala de aula. Os alunos adoraram, mas os professores entraram em pânico”, brinca a mestra.

Já nos anos 70, o terreno da escola foi comprado pela Rede Globo, que construiu um de seus prédios no bairro, e o Souza Leão migrou para a Rua Macedo Sobrinho, no Humaitá, onde funcionou até o seu fechamento, na década de 1990. Mas, Leda ficou somente até 1981 quando saiu após a morte da fundadora, Maria de Lourdes Souza Leão, devido a discordâncias com a nova direção. Um ano depois, a professora juntou-se a amigas para criar o Espaço Educação, que funciona até hoje, no Leblon, e trabalha com o segmento da educação Infantil. 

– Eu nunca deixei de acreditar na educação como ferramenta de transformação. O mundo estava mudando e eu quis criar uma escola que fosse um pouco menos tradicional, que seguisse as atuais tendências. Com a ajuda de Dumerval Trigueiro, filósofo da educação, eu e minhas colegas formulamos a proposta pedagógica do Espaço, que hoje é gerido por Isabela Sechin – explica ela, que ficou por 23 anos à frente da nova escola.

Dedicatória de uma aluna a Leda. (Foto: acervo familiar)

Atualmente, Leda curte seus dias de forma leve, mas nunca deixou a idade abalar. Sua rotina inclui teatro, cinema e galerias de arte, além de explorar outras partes da cidade. “Recentemente, fui a Niterói, para conhecer o novo Mercado Municipal e visitar a Casa Janete Costa, que tem um acervo de arte popular espetacular”, conta a professora, que indica o filme “Pérola”, que é baseado no texto de seu ex-vizinho, Mauro Rasi. “Espetacular”. 

O conhecimento e o aprendizado nunca deixaram de fazer parte do dia a dia de Leda, que é uma leitora voraz e, no momento, está relendo “O Povo Brasileiro”, de Darcy Ribeiro. “No ano passado, li muito sobre cultura negra e sobre a Amazônia também. Sou muito curiosa. Gosto de conversar com os moços da banca de jornal e até com os rapazes que consertam cadeiras na rua”, conclui.

Para o futuro, Leda revela o desejo de ajudar o Colégio Estadual Adelina de Castro, em Duque de Caxias, que recebe o nome de sua avó. “Já conversei muito com o diretor da escola, e quero contribuir da maneira que for, promovendo eventos culturais, por exemplo. Sempre vou acreditar na educação!”, conclui Leda de Castro, seguindo o exemplo de Paulo Freire. 

 

5 Comentários

  1. Guido

    Ótima matéria !
    Precisamos cada vez mais de muitas Donas Ledas !

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  2. Jorge de Campos Valadares

    Leda é uma pesssoa única. Tem uma vitalidade e um amor ao ensino fundamentado sobretudo no convívio inter-humano!

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  3. Chico Diaz

    Maravilhoso obrigado obrigado alegria

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  4. Renato Soares Bermudas

    Matéria respeitosa e clara na homenagem a esta especial Educadora que reflete o brilho e a força de um professor que no seu cotidiano luta para uma Educação Brasileira melhor! Parabéns!

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  5. Lindoraci Porto Aquino Hido Bitar

    Quem trabalha com educação e para a educação são pessoas inesquecíveis na vida de outras, como seus alunos. Nunca deixarão de existir na memória destes, como a Sra. Leda, professora de nome. O que ela deixa nunca vai ser esquecido. Parabéns, professora Leda, pelo bem que você fez a todos que passaram pelos seus ensinamentos. Viva a Dona Leda de hoje e sempre.

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