16 de março de 2023
UMA BIBLIOTECA NO MEIO DO JARDIM

Texto e fotos: Chris Martins

Não é novidade que o Jardim Botânico do Rio de Janeiro guarda muitos tesouros, da história e da botânica do país.  Dentre tantos, uma jóia rara encontra-se, quase escondida, no prédio anexo ao Museu do Meio Ambiente, logo na entrada do parque. Trata-se da Biblioteca Barbosa Rodrigues (JBRJ), que guarda 43 mil volumes, entre livros, iconografias, dissertações e teses na área de botânica, além de mais de cem mil periódicos. O espaço, com entrada gratuita, é aberto a estudantes e ao público em geral, interessado em ciência, biologia, jardinagem e as visitas guiadas podem ser agendadas por escolas públicas e instituições.

Assim que assumiu o posto de diretor da instituição, João Barbosa Rodrigues – um dos mais importantes cientistas brasileiros na época – teve a ideia de montar uma biblioteca, que foi inaugurada em 23 de junho de 1890. A partir daí, o JBRJ, – que pertencia ao Ministério da Agricultura e era voltado para o desenvolvimento agrícola -, passou a ter como finalidade principal a ciência e a cultura. Mas foi somente em 1946 que a Biblioteca Barbosa Rodrigues passou a funcionar no prédio em que se encontra atualmente e que, de tempos em tempos, passa por uma reforma para melhorar as condições de armazenamento das obras. Para quem estranha uma biblioteca no jardim, Rosana Medeiros, bibliotecária responsável pelo espaço há 20 anos explica:

– Em vários lugares do mundo é comum o Jardim Botânico ter uma biblioteca, que cresce junto com o herbário, reunindo as obras príncipes, os primeiros registros das plantas identificadas.

A Bibliotecária Rosana Medeiros mostra a obra mais antiga, de 1565 e o acervo doado por Dom Pedro II

Também fazem parte do acervo os desenhos originais de João Barbosa Rodrigues, “Iconographie des orchidées du Brésil” (1877-1891) e os de Peter Lund, do século 19, sobre sua pesquisa em Lagoa Santa, Minas Gerais.Entre os periódicos estão a Revista Rodriguésia – que leva este nome em homenagem ao fundador da biblioteca –, produzida pelo Instituto de Pesquisas do JBRJ para divulgar artigos científicos e inéditos em diversas áreas da biologia e história da botânica. No espaço também podem ser encontrados os periódicos internacionais Paxton Magazine of Botany, o Botanical Register e a Ilustrierte Garten Zeintung. Mas nem tudo se resume à Botânica e o visitante encontra ainda várias obras dedicadas à história da cidade do Rio de Janeiro.

Atualmente Rosana comanda uma equipe de três pessoas, que cuidam do acervo, que conta ainda com 4.000 volumes raros de publicações do século XVI. Ela conta que foi o diretor Barbosa Rodrigues quem pediu à Dom Pedro II – que estava de partida para Portugal – para que ele doasse para a biblioteca do parque suas obras de botânica –  15 volumes em versão pocket -, que estão até hoje conservadas com selo da família real.  Mas a edição mais antiga, de 1565, é a obra Commentarii in sex libros Pedacci Dioscordis Anazarbei De medica materia”, de Pietro Andrea Mattioli. O livro traz ilustrações e descrições de plantas, animais e minerais que eram utilizados para fins terapêuticos no século 16. Além do JBRJ, somente a Biblioteca Nacional possui a obra. Outra raridade é a coleção Flora Brasiliensis, idealizada e editada, em sua maior parte por Karl Friederich Phillipp von Martius.

A entrada da Biblioteca fica ao lado do Museu do Meio Ambiente e reúne mais de 40 mil obras

Ao longo dos seus 133 anos, a Biblioteca Barbosa Rodrigues passou por várias reformas, sempre com o objetivo de melhorar o armazenamento dos livros. Em 2005 começou a informatização e, entre 2007 e 2008, a instituição fechou um convênio com a Petrobras para obras de conservação, com o objetivo de recuperar todo o acervo de obras raras.  Atualmente o espaço encontra-se totalmente digitalizado, o que facilitou o acesso durante a pandemia. Rosana lamenta que esta facilidade tenha, de certa maneira, diminuído o movimento de pessoas na biblioteca.  “Atualmente as pessoas preferem pesquisar on-line”, afirma ela, que vê com bons olhos a circulação de pessoas na área, especialmente estudantes, biólogos, botânicos e até celebridades, como o ator Paulo Betti, que costumava ir com frequência. 

Carrinho com doação de livros

As visitas à BBR podem ser feitas de segunda a sexta, das 9h às 17h, mas devem ser obedecidas algumas regras, como em qualquer biblioteca. NÃO PODE: usar o celular, fumar, falar alto, entrar com bolsas (que deverá ser guardada em um guarda-volume na entrada) e entrar com alimentos e bebidas.  O hall de entrada conta com uma máquina de xerox, que permite fazer cópias das obras, ao valor de R$0,15 cada folha; um computador para pesquisas na internet apenas de catálogos e periódicos eletrônicos; e um carrinho com doações de livros. Um painel na entrada faz (justa) homenagem à Graziela Maciel Barroso, primeira mulher a fazer o concurso para naturalista do JBRJ e que se tornou a maior taxonomista de plantas do país, reconhecida como a primeira dama da botânica no Brasil, que faleceu em 2003.  A biblioteca mantém  intercâmbio com mais de 650 instituições nacionais e estrangeiras e realiza ainda a coleta, seleção e organização de acervo específico de jardins botânicos nacionais e estrangeiros.

Biblioteca Barbosa Rodrigues

Rua Jardim Botânico 1008

Horário: de segunda a sexta, de 9h às 17h

Entrada gratuita | Visitas guiadas só com agendamento

Tel.: (55 21)3874-1219 e (55 21)3874-5656
biblioteca@jbrj.gov.br

SOBRE BARBOSA RODRIGUES

Pouco se fala de João Barbosa Rodrigues. Seu nome não figura em nenhum logradouro do Jardim Botânico, mas seu trabalho foi fundamental para a existência do Instituto de Pesquisas JBRJ. Formado em engenharia, o carioca também era escritor, naturalista, botânico e etnógrafo, tendo sido professor de desenho do Colégio Pedro II.

Rodrigues esteve na Amazônia em missão científica durante o governo imperial (1872-1875) e, por conta desse contato, acabou criando, em 1883, o Jardim Botânico em Manaus, que foi extinto na República. Durante este período, coletou e transcreveu narrativas orais indígenas da Amazônia no fim do século XIX, que  resultaram no livro Poranduba amazonense, ou Kochiyma-uara Porandub, em 1890.

 

Dirigiu o Jardim Botânico do Rio de Janeiro de 1890 até sua morte, em 1909. Neste período publicou uma obra de vasta extensão, incluindo Genera et species orchidearum novarum, seu trabalho sobre orquídeas nativas do Brasil e sobre palmeiras nativas do Brasil, Sertum Palmarum Brasiliensium. No acervo da biblioteca consta um original de Barbosa Rodrigues em homenagem ao centenário do JBRJ, com ele apresentando o parque em todos os ciclos da colônia à república.

No Jardim Botânico foi responsável pela organização do arboreto e do herbário, dando uma configuração científica aos espaços, além de instalar o chafariz central e os bebedouros. Coube ao cientista também a liberação total de visitas sem acompanhamento entre 1890 e 1894, quando quase 150.000 pessoas visitaram o parque. Até então, o espaço não era aberto ao público. A única referência ao ilustre cientista está na principal alea do parque, que leva seu nome.

0 comentários

Trackbacks/Pingbacks

  1. OBRA DO NATURALISTA VON MARTIUS AGORA EM PORTUGUÊS – JB em Folhas - […] para a pesquisa da fauna e da flora brasileira. Com mais de 40 volumes, ela pode ser consultada na…

Enviar um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Artigos relacionados